quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Nelson Freire - Interpreta Villa-Lobos (1997)



"A Prole do Bebê nº 1, para piano, é um marco importante na biografia de Villa-Lobos: Arthur Rubinstein, o grande pianista polonês, encantou-se por essa coleção de oito peças inspiradas basicamente em canções folclóricas: passou a tocá-la por todo o mundo (sobretudo o Polichinelo, que gostava de dar como extra): e foi assim que a fama de Villa-Lobos transpôs as nossas fronteiras.
nada
Nas mãos de Nelson Freire, essa primeira Prole aparece, aqui, em toda a sua concentrada poesia e colorido. Villa-Lobos, nesta série, ainda está próximo do impressionismo francês (o que já acontecia com a segunda Prole, de 1921).
nada
A escrita é mais transparente, exige um domínio absoluto da técnica. Mas, por baixo desses cristais franceses, lá está o Villa profundo, cantando logo na Boneca de Louça, que abre a série. A Boneca de Massa, que se segue, é como um rio que corre, infinito, cheio de sombras e luzes, uma verdadeira criação em termos de linguagem pianística, tanto mais extraordinária quanto Villa-Lobos nunca foi um grande pianista, muito mais ligado, como intérprete, ao violão e ao violoncelo.
nada
Já se disse que Villa-Lobos é um compositor caudaloso que não consegue controlar a sua própria produção. Pois ei-lo aqui, no Prelúdio das Bachianas Brasileira nº 4, trabalhando só o essencial: uma linha melódica muito pura, de fragrância realmente bachiana, e uma linha de baixo. É quase só isso; e também uma regularidade absoluta, que contribui para a atmosfera de paz transcendente, e Nelson Freire sublinha essa grandeza clássica através do seu fraseado, e da mais cuidadosa gradação dinânica.
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Essencial é também o Villa-Lobos de As Três Marias, três pequenas peças da sua maturidade, onde ele se compraz em reproduzir a luz álgida das estrelas, trabalhando na região aguda do piano. É como que uma prefiguração das Cartas Celestes de Almeida Prado, num clima de depuração completa. Este pequeno tríptico foi escrito em 1939 a pedido de Edgar Varèse, estreado por José Vieira Brandão, no mesmo ano, no Rio de Janeiro.
nada
Com o Rudepoema, escrito entre 1921 e 1926, chegamos finalmente ao Villa-Lobos torrencial, ciclópico, numa peça em que ele se propunha a fazer o retrato musical de Arthur Rubinstein. Não se sabe se Rubinstein se reconheceu no retrato. Talvez seja mais próprio falar de um auto-retrato - do Villa-Lobos irredutível a formas, a limitações, às vezes selvático, refletindo um temperamento fortíssimo, uma inspiração vulcânica. Poucas peças existem que coloquem tantas exigências ao intérprete, não só de técnica mas, sobretudo, de discernimento para caminhar no meio desta selva. A versão de Nelson Freire é um ótimo guia para essas complexidades, um monumento ao compositor e ao intérprete.
nada
Luiz Paulo Horta
nada
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A PROLE DO BEBÊ
1- Branquinha - A Boneca de Louça
2- Moreninha - A Boneca de Massa
3- Caboclinha - A Boneca de Barro
4- Mulatinha - A Boneca de Borracha
5- Neguinha - A Boneca de Pão
6- A Pobrezinha - A Boneca de Trapo
7- O Polichinelo
8- Bruxa - A Boneca de Pano
nada
9- Bachianas Brasileiras nº 4 - Prelúdio
10- As Três Marias
11- Rudepoema

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